Jerônimo Durski e a Colônia Orleans

por João Cândido Martins — publicado 19/04/2013 08h40, última modificação 28/08/2020 14h13
Jerônimo Durski e a Colônia Orleans

Fotografia do livro de Ruy Wachowicz, de 1976, sobre o Orleans. (Foto - Anderson Tozato)

A Rua Jerônimo Durski liga a Pracinha do Batel (Pç. Miguel Couto) até o Largo do Terço, no Bigorrilho, passando pelo Terminal do Campina do Siqueira. São aproximadamente 2 quilômetros, que demandariam cerca de 25 minutos para serem percorridos por um pedestre. O texto a seguir conta a história da pessoa  homenageada nesse logradouro público e de seus vínculos com a comunidade polonesa de Curitiba.

Em 1880, Dom Pedro II esteve de passagem por Curitiba. Após visitas a Paranaguá, Antonina e Rio do Meio, a comitiva chegou a Curitiba pela estrada de São João da Graciosa. Já no caminho para Campo Largo, Palmeira e Ponta Grossa pela antiga Estrada do Mato Grosso (atual BR 376), o imperador e sua comitiva foram recebidos de forma efusiva pelos colonos moradores da Colônia Orleans a dez quilômetros do centro da cidade, mas é possível que entre eles houvesse ao menos um descontente: o professor polonês Jerônimo Durski, mestre-escola local.

Com um atraso de quatro meses em seu salário, Durski requereu junto ao imperador o pagamento do que lhe seria devido em função dos serviços prestados na Colônia, mas não obteve sucesso. Com um número cada vez menor de alunos, o professor que foi considerado o “pai da escola polonesa no Brasil”, assistia os colonos enviarem seus filhos para a escola do padre Ludovico Przytarski, capelão da colônia.

A comunidade aproveitou a passagem do monarca para solicitar ajuda na conclusão da capela que fora iniciada por iniciativa do padre Ludovico. Dom Pedro II prometeu o envio de uma imagem de Santo Antônio e dois sinos. Os presentes chegaram alguns meses depois e passaram a ornar a capela, que foi concluída naquele mesmo ano de 1880. Muito sacrifício ela custou aos colonos. O historiador Ruy Wachowicz comenta que, segundo a tradição oral da região, os tijolos usados na construção foram amassados com os pés, pois não havia maquinário nem animais de tração. Muitos destes tijolos foram utilizados na construção de uma casa para o uso do padre Ludovico Przytarski.
   
Hieronim
Insatisfeito com as circunstâncias políticas na Polônia, Hieronim Durski resolve mudar-se com a família para o Brasil muito antes das levas imigratórias do período Lamenha Lins. O professor desembarcou no Porto de Itajaí em 1851 e, nos anos seguintes, aprendeu sozinho o português e passou a acumular experiências que resultaram na sua efetivação como mestre-escola. Durski era professor de primeiras letras diplomado pelo Seminário Real Católico do Reino da Prússia. Em 1876, foi nomeado para a vaga na primeira escola polonesa de Curitiba, localizada justamente na Colônia Orleans, convite prontamente aceito.

De início, tudo transcorreu bem, com exceção do fato de que alguns pais negligenciavam a educação dos filhos. A julgar pelas cartas envidas por Durski a algumas autoridades, essa situação o deixava bastante perturbado. Em 1878, o Ministério da Agricultura (responsável pelo pagamento dos professores) promoveu uma redução drástica nos vencimentos. Naquele mesmo ano, com a chegada do padre Ludovico Przytarski a situação tomou outra configuração para Durski. O historiador Ruy Wachowicz comenta que o padre acusou o professor de ser o responsável pelo atraso nos pagamentos. Além disso, fez exigências vexatórias, como por exemplo, a de que uma das filhas de Durski trabalhasse na limpeza e administração da residência do padre, proposta que foi repudiada por Durski.

O pior de tudo residia no fato de que o capelão convencerá os fiéis de que não era apropriado aprender sobre religião na língua portuguesa, a exemplo do que realizava Jerônimo Durski. Como o padre também ensinou que não haveria assunto fora da religiosidade, sua lógica conduziu a um afastamento daqueles colonos da escola do professor Durski. A própria escola acabou por encerrar suas atividades e o professor foi transferido para outra escola, no Batel. O padre Ludovico Przytarski passou a receber o dinheiro que seria destinado a Durski como pagamento pelas aulas, mas a empolgação esmoreceu e a escola que Ludovico mantinha não durou mais do que dois anos. A Colônia Orleans permaneceu desprovida de ensino formal por um longo período. Anos depois, já em 1899, a antiga Casa Paroquial construída pela comunidade para o conforto do padre Przytarski foi demolida.

“Elementarz”
Ao aposentar-se em razão de deficiência auditiva, Durski passou a receber um salário menor do que esperava. Isso não o impediu de escrever uma obra fundamental para a consolidação da colonização polonesa no Paraná: “Elementarz”, livro bilíngue impresso na Polônia em 1893, e divulgado no Brasil a partir do ano seguinte. Na obra, Durski expõe ao imigrante as caraterísticas e costumes brasileiros, bem como fornece uma breve explicação sobre a língua portuguesa para falantes de polonês. A chamada “cartilha polaca” - livro de cabeceira de muitas gerações de imigrantes, foi um dos fatores que embasaram a escolha por parte da Câmara Municipal de Curitiba do nome de Jerônimo Durski em 1954, para nomear uma pista vicinal que inicia no fim da rua Gabriel de Lara, no Seminário, e acaba nas imediações do Parque Barigüi, no Bairro Campina do Siqueira.

Referências bibliográficas

“Orleans, um século de subsistência”, do historiador Ruy Christovam Wachowicz. Editado pela Fundação Cultural de Curitiba (Edições Paiol, FCC), em 1976.

“A Paróquia de Santo Antônio de Orleans – 1879/1973”, dissertação de Marta de Souza Lima Brodbek, redigida em 1983 para o Mestrado em História da Universidade Federal do Paraná. Para ler esse texto, clique aqui.